No mundo da tecnologia, há uma brecha digital de gênero, raça e classe

FONTE: Artigo publicado na Folha de São Paulo (16/03/2011)

Veja o PDF do jornal com o artigo de 16 março de 2011.

Artigo de Karla e Graciela na Folha de São Paulo

GRACIELA NATANSOHN
KARLA BRUNET
ESPECIAL PARA A FOLHA DE S. PAULO

Recentemente, surgiram notícias de que as mulheres lideram no uso de redes sociais como Facebook, Twitter e Orkut. Um dado relevante, que mostra a familiaridade delas com o uso das redes sociais. Ao mesmo tempo, nos questionamos: onde estão as mulheres na liderança nesses serviços de internet?

Se pegarmos, por exemplo, os maiores êxitos da internet dos últimos anos -Google, Facebook e Twitter, por exemplo-, notamos que todos foram criados por homens. Ainda assim, elas representam a maioria dos usuários desses serviços.

Outra constatação similar surge quando comparamos a quantidade de mulheres e homens em cursos e congressos de computação, informática e software. A grande maioria de participantes apresentando trabalhos teóricos e práticos são homens. Onde estão as mulheres?

Nesse cenário, elas não partilham de igual a igual com eles no acesso à cultura digital. Mesmo um olhar leigo perceberá que a relação entre mulheres e internet não é muito diferente da entre mulheres e mídias tradicionais: a imagem delas é superexplorada para a pornografia e, na maioria das vezes, com viés preconceituoso.

Do outro lado, portais dirigidos à mulher repetem estereótipos sexistas tradicionais, que remetem a mulher ao lar, às compras, à beleza, à saúde e ao consumo.
Há uma brecha digital de gênero, raça e classe: ser mulher e ser negra é estar entre as mais pobres dentre as pobres. O acesso ao computador é afetado pela pouca inserção feminina em postos de decisão técnica, no desenvolvimento de tecnologias úteis para elas e na produção de conteúdo.

O Brasil tem grande quantidade de mulheres interessadas no tema, que trabalham e sabem muito de tecnologia, mas elas não estão nas mais altas instâncias de poder: na Anatel, no Comitê Gestor de Internet e no Ministério das Comunicações.

Há temas mais prioritários na agenda das mulheres, dizem uns: perante a violência, o assédio moral e sexual, os problemas de saúde e moradia, a tecnologia é menor.
Nada mais falso: a internet é uma excelente ferramenta para que elas possam se defender e se informar.

O desafio é fazer das mulheres sujeitos da comunicação em redes, e não meras usuárias. Devem ser agentes ativas nos processos de desenho, aplicação, recepção e avaliação de projetos em rede. E fazer da tecnologia, a sua aliada.

No bojo da luta pela democratização da comunicação, é preciso -e urgente- que as usuárias de internet percebam as tecnologias da informação e comunicação com um olhar estratégico, como ferramentas de criação, expressão, produção e fortalecimento individual e das organizações de mulheres.

GRACIELA NATANSOHN e KARLA BRUNET
estudam cibercultura e feminismo na Universidade Federal da Bahia

Sobre Mônica Paz

Mônica Paz é doutoranda e mestre (2010) pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas, na linha de pesquisa sobre Cibercultura, da FACOM/UFBA. Bacharel em Ciência da Computação pelo DCC/IM/UFBA (2007). Entusiasta do movimento Software Livre, já colaborou com a comunidade baiana desse movimento em alguns de seus eventos.