Conversas sobre soberania tecnológica: desafios e possibilidades

Entre os dias 29 e 31 de março, aconteceu uma série de conversas sobre Soberania Tecnológica a partir do debate do projeto do governo argentino de criar uma Nuvem Pública Nacional. O evento intitulado “Ciclo Conversas em Rede V – Soberania tecnológica: o que implica e como alcançá-la? Debates sobre a criação da Nuvem Pública nacional” ocorreu de modo remoto e foi coorganizado pelo Grupo de Pesquisa em Gênero, Tecnologias Digitais e Cultura (GIG@/UFBA/Brasil) e o Grupo de Investigación Apropiación de Tecnologías digitales y Comunicación (GATEC/UNC/Argentina). O conteúdo dos 6 painéis de debate está disponível no canal do Youtube da Facultad de Comunicación da Universidade Nacional de Córdoba.

Entre os principais enfoques dos debates estava a própria definição de soberania tecnológica que pode estar associada à capacidade do Estado de decidir sobre o uso e as tecnologias que melhor atendam aos interesses nacionais. Esse conceito tem muito a ver com políticas públicas em torno da proteção de dados pessoais, a distribuição do espaço radioelétrico, a regulamentação da mineração, a lei do conhecimento aberto, a criação da nuvem pública nacional, o plano de energia atômica, entre outras questões de vários tipos.

Nesse sentido, também foi levantada a necessidade de conceber políticas públicas partindo da complexidade da ideia de soberania (principalmente quando se contrapõe às experiências do colonialismo, extrativismo de dados etc.) para que qualquer intervenção seja produtiva. Propôs-se pensar o termo autonomia tecnológica (que é um conceito mais associado a práticas de comunidades e redes tecnológicas locais, como as realizadas por Altermundi em Córdoba, Rizhomática no México, ou MariaLab e Vedetas no Brasil), um conceito de soberania mais centrado na sociedade civil. Outra dimensão marcante da soberania nas conversas estava ligada à educação, alfabetização e formação de alunos nessas questões.

Foi consenso repensar essa autonomia no âmbito dos Estados-nação, pelo menos na região latino-americana e com a participação plena e permanente da sociedade civil, e avançar no desafio de definir estratégias regionais que permitam ampliar as capacidades, negociação e margens de lucro. As privatizações de recursos estratégicos, como as telecomunicações, o espectro eletromagnético e as posições de satélites, põem precisamente em risco as possibilidades de soberania e/ou autonomia nacional e regional.

Muitas falas foram marcadas por críticas a modulação comportamental e a mineração de dados com fins de produção de lucro das megacorporações transnacionais. No âmbito do chamado capitalismo de plataforma, os dados servem, entre outras coisas, para competir por atenção, para oferecer algo particular a cada usuário que o ajude a continuar a usar a plataforma e / ou consumir determinados produtos. Os dados são a matéria-prima do chamado “capitalismo de dados” ou capitalismo de plataforma, conforme mencionado. Tal capitalismo também está associado a precarização do trabalho, também chamada de uberização, implantada fortemente a partir da crise global de 2008 por empresas que oferecem serviços por aplicativo como Uber, Rappi, AirBnB, etc..

Demarcou-se que os países precisam melhorar a qualidade do tratamento dos dados pessoais, especialmente no que se refere ao armazenamento dos bens criados pelo Estado como recursos estratégicos. Entretanto, foi demarcado que no contexto argentino a lei de dados pessoais, apesar de ser um tanto antiga, não é um instrumento jurídico descartável.

Em relação especificamente a iniciativa da nuvem pública nacional argentina argumentou-se que é sempre preferível estatizar a deixar a gestão e o controle desses dados nas mãos de empresas transnacionais. O Estado está enquadrado por normas jurídicas e constitucionais, e é um ator sobre o qual podemos exercer pressão política e social, impactar com essa pressão. As políticas governamentais são controladas de forma cruzada entre os poderes do Estado, agentes privados e cidadãos.

Confira o painel de encerramento do evento, no qual foi resumido e sistematizado os debates de todo o ciclo de conversas:

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